terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Meditar _1



Temos que entrar em comunhão com a gente mesmo, perceber aquilo que nos cabe fazer aqui nesse mundo, em meio a isso tudo, esse caos, essa loucura. Temos que parar às vezes, parar mesmo e meditar. Às vezes me perguntam como é que se medita, e eu respondo que basta fechar os olhos e prestar atenção na respiração. Aliás, em quantas coisas não prestamos atenção... porque, também, não se pode naturalmente estar a par de tudo, de tudo pelo menos que se passa com a gente, especialmente tudo que se passa dentro. Principalmente o que se passa dentro, se já é tão difícil perceber o que se passa fora, no corpo e ao redor...

Então, o meditar. Muitas vezes, quando estou no metrô, eu medito. Escolho um canto, em pé mesmo, fecho os olhos e me atento à respiração. E não há nada de complicado, ou nada de esotérico ou misterioso nisso. Basta apenas prestar atenção na respiração. Porque quando fechamos os olhos para meditar, enxergamos, enxergamos com tamanha nitidez o que se passa no pensamento. Uma agitação tamanha vem à tona, vem à consciência. Essa agitação é ressonância do que se passa em volta de nós. Sim, somos antenas para tudo, conectados com tudo, seja lá o que for esse tudo. E nosso espírito vibra conforme o ambiente em torno de nós, e, conforme seja conturbado e perturbador, assim vibrará nosso espírito, conturbado, perturbado, e o corpo, por sua vez, entrará em ressonância com o espírito e...

Então, fechemos os olhos um pouco. Isso não é fechar os olhos para a realidade, aliás, seja lá qual ela for, seja lá qual seja, realidade, essa coisa que se nos chega através de palavras, e imagens, e palavras sobre as imagens, colorindo as imagens com sentimentos e interesses que convêm a quem está narrando os fatos.

Meditemos.

E, ao mesmo tempo que prestamos atenção à nossa respiração, podemos prestar atenção um pouco ao nosso espírito: o que fazemos realmente?, o que queremos?, o que se vale à pena?, para nós, para outro, para outros, para o mundo... Meditemos, nem que seja por alguns segundos, nem um minuto completo, segundos, nem que seja um respirar fundo, mais um respirar fundo que realmente encha os pulmôes, que encha o peito, e oxigene não apenas nosso corpo. Meditemos... Eu diria até que o modo certo -- bem, há um modo certo, sim, é verdade -- de se meditar: devemos respirar com o abdômen, abaixo do umbigo, como se o ar estivesse enchendo um espaço abaixo desse, o espaço do baixo-ventre. Mas, nada de se forçar isso, pois isso é, em princípio, um exercício de pensamento, e, pensamento, é a centelha inicial de uma realidade que vai tomar lugar nesse mundo.
Mundo... qual nosso lugar que devemos tomar, neste?

Meditemos.


Rio, 30 de dezembro de 2014.

antônio bizerra

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Desafio...


Eis o desafio, um desafio contra si mesmo -- em prol de si mesmo: escrever algo. Sentar-se a uma mesa, abrir um bloco ou um caderno e escrever, sair escrevendo, preenchendo o espaço em branco, relatando tudo isso que está dentro de si, desbravando o deserto de uma página em branco. Então, o desafio: escrever algo.

Como sou poeta, e escritor, possuo artimanhas para tão simples, embora muitas vezes difícil, ato de escrever. Artimanhas. Eu as desenvolvi ao longo de minha vida de poeta e escritor. Ou melhor, eu as deixei que se desenvolvessem em mim, que encontrassem terreno fértil em minha alma e que, assim, florescessem em galhos e ramos e folhas incontáveis inúmeras, e sempre morrendo e se renovando. Deixei-as, e assim fui me compondo.

Mas, voltando-se ao algo, isso que deve ser escrito, isso que deve riscar o espaço deserto da página em branco e deixá-la agora como uma floresta exuberante, cheia de árvores e plantas que impõem uma nova ordem ao vento que soprava livremente por sobre esse deserto e que agora deverá obedecer a essas inúmeras árvores e plantas nesta nova dinâmica pontuada do espaço, agora ordenado em vias e desvios, em sendas e vertentes, e até por entre a rede fina de uma teia de aranha, ou por entre a trama viva de galhos e ramos e folhas.

Bem, com estas palavras, termino com o cumprimento deste desafio, deixando esta página toda preenchida e lançando ao leitor o mesmo desafio. Sim, eu possuo as artimanhas, que é de meu ofício. Mas, antes de eu estar incumbido deste ofício, eu também não era poeta, nem escritor mas, escrevia, e aceitava o desafio.

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05 de setembro de 2014

antônio bizerra

quarta-feira, 22 de outubro de 2014


esse instrumento, e meio -- palavra --, me procura pq eu a procuro,
e me encontra pq eu a encontro e tudo isso faz encontrar.
escrever exige de todo ser, de todo o ser, de todo-ser para a escrita.
os amigos diletos sentem falta de mim na Música,
mas não sabem o quanto a Poesia exige,
e não digo isso para me esnobar de que exerço um ofício difícil, mas, de fato o exerço.
e, ainda mais me ausento nestes momentos quando surgem outros compromissos e, assim, sou por completo arrebatado da presença destes amigos necessários a meu bem viver.

uma das coisas q as pessoas não sabem sobre os filhos únicos:
eles lutam contra a investida intensa e ininterrupta dos pensamentos,
pois não havia a presença de alguém de sua faixa de idade, na infância, que o tirasse de dentro de si e o chamasse para a porrada e o aborrecimento,
e o retirasse do Silêncio para viver mais como vivente do que como pensador

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texto via whatsapp para uma amiga tão querida e sempre presente.


13 de outubro de 2014

antônio bizerra

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Vocação


Olhou-se no espelho e, em pleno delírio devido ao calor atual, viu que sua gravata se transformava em serpente, e, num bote rápido por se sentir em perigo entre o homem e seu reflexo, morde o reflexo no rosto e o advogado tomba, envenenado. Mas, no dia seguinte, acorda em um barco, a milhas distantes daqui.


10 de fevereiro de 2014.

antônio bizerra

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

PRESSÁGIO



o que aquela mulher desconhecida lhe soprou ao ouvido qdo cruzou por ele na rua era "morte". mas, como foi um sussurro, ele ficou em dúvida entre "morte" e "sorte". escolheu, então, a "sorte". pronto, foi isso que ouvira: "sorte". então, pensando na sorte e distraído no enlevo de um bom presságio, atravessou a rua sem prestar atenção e foi atropelado por um corsa sedan. deitado ao chão com a consciência ainda nas engrenagens do instante, mas o coração em outras esferas do tempo, regurgitou o sangue que lhe salgava a garganta, e sorri, sabendo-se com sorte, com toda a sorte que lhe fôra dada num instante.


Rio, 10 de fevereiro de 2014.

antônio bizerra